Dr. Renato Mikio Moriya responde dúvidas sobre alimentação na infância, os riscos da obesidade infantil, os efeitos no desenvolvimento, entre outros assuntos
O pediatra Renato Mikio Moriya, membro da Sociedade Brasileira de Pediatria e docente do Departamento de Pediatria e Cirurgia Pediátrica da Universidade Estadual de Londrina (UEL), conversou com o blog da Unimed Londrina sobre a importância da alimentação saudável na infância. Entre outros assuntos, o especialista falou sobre os problemas de saúde que uma criança obesa pode apresentar, fatores que podem causar obesidade infantil, a importância dos nutrientes na alimentação e como isso influencia no desenvolvimento. Confira a entrevista completa!
Unimed Londrina (UL): Quais os riscos da obesidade infantil à saúde da criança?
Renato Moriya (RM): A obesidade é considerada um dos maiores problemas de saúde pública na atualidade e está fortemente relacionada ao maior risco cardiovascular, que inclui hipertensão arterial sistêmica; acúmulo de gorduras nos principais vasos sanguíneos do coração; disfunções cerebrais; aumento de açúcar no sangue e aumento de gordura corporal, que elevam a chance da pessoa ter diabetes e ataque cardíaco; diabetes melito; inflamação da vesícula biliar; problemas ortopédicos; psicológicos e câncer.
UL: Quais os fatores que podem causar a obesidade infantil?
RM: Apesar das múltiplas causas de obesidade, a de causa nutricional, denominada simples, representa o tipo mais frequente e as mudanças ocorridas no estilo de vida da população, levaram a hábitos cada vez mais sedentários e à adoção de alimentação pouco saudável.
A história familiar também é muito importante para a determinação da ocorrência da obesidade. Se uma criança tem pais obesos, ela terá 80% de chance de desenvolver obesidade. Essa situação cai para 40%, se somente um dos pais for obeso, e, se nenhum dos pais forem, essa criança terá apenas 7% de chance de se tornar uma pessoa obesa.
UL: A criança que se alimenta mal pode ter falta de nutrientes?
RM: Sim. A nutrição tem papel fundamental no crescimento e desenvolvimento durante toda a vida. Entretanto, na infância, se torna mais relevante, visto que as crianças necessitam de maiores quantidades de nutrientes por estarem em crescimento. Vale enfatizar que, tão importante quanto a quantidade é a qualidade.
A deficiência de nutrientes pode acarretar na desnutrição, tanto pelo consumo insuficiente de calorias ou proteínas, quanto pela falta de um determinado nutriente, como: ferro, que é responsável pela fabricação de células vermelhas do sangue e pelo transporte do Oxigênio e sua falta provoca a anemia; vitamina D, que regula o fornecimento de cálcio e fósforo e sua falta pode levar ao enfraquecimento dos ossos; vitamina C, que aumenta a produção de glóbulos brancos, responsáveis por combater microrganismos estranhos no corpo; iodo, responsável pela produção de hormônios para a tireoide; zinco, que é fundamental para o sistema imunológico e a vitamina A, responsável pelo desenvolvimento e crescimento do ser humano.
A desnutrição ainda pode ser primária: por oferta insuficiente de alimentos, decorrente de condições socioeconômicas desfavoráveis. Ou secundária: quando há um aproveitamento insuficiente ou inadequado dos alimentos oferecidos, que tem como causas orgânicas vômitos persistentes, má absorção ou mau aproveitamento devido à doença crônica.
UL: Mesmo apresentando obesidade, a criança pode ser desnutrida?
RM: Exato, pois a desnutrição pode ser específica, por falta de qualquer um dos micronutrientes. As crianças representam um grupo de grande vulnerabilidade para deficiências de vitaminas e minerais, devido ao rápido crescimento e desenvolvimento nos primeiros anos de vida.
A carência de micronutrientes, conhecida como “fome oculta”, afeta cerca de 1/3 da população mundial, aumentando a suscetibilidade das crianças a diarreias e infecções, além da possibilidade de comprometer o desenvolvimento dos sistemas nervoso, visual, mental e intelectual. A fome oculta recebe essa denominação por se instalar de maneira silenciosa, sem sinais clínicos aparentes.
O consumo alimentar de crianças brasileiras é marcado pela prevalência elevada de inadequação no consumo de vários micronutrientes. Isso não se apresenta apenas sob o aspecto da deficiência, mas também pelos excessos calóricos, em alimentos como salgadinhos, frituras, biscoitos, doces, refrigerantes, farináceos no leite, entre outros.
UL: Quais problemas essa situação pode trazer na fase de desenvolvimento?
RM: A criança e o adolescente obesos apresentam maiores riscos para o desenvolvimento de doenças relacionadas ao excesso de peso. Além de prejuízos psicossociais, provocados pelo estigma da obesidade. Assim, o peso excessivo é um fator de risco chave para muitas doenças crônicas. O excesso de gordura afeta quase todos os órgãos do corpo, mas alguns sistemas importantes, como o cardiovascular e o endócrino, são mais comprometidos do que outros, e podem desencadear doença e morte prematura. Tem também a questão da auto-estima baixa e maior tendência à depressão e ansiedade, pois essas crianças e adolescentes tendem a permanecer isolados e com menos amigos que os não-obesos.
UL: Qual o papel dos pais na alimentação dos filhos e o que pode ser feito para incentivar uma alimentação mais saudável?
RM: Sabemos hoje que os primeiros mil dias de vida de uma criança, desde a concepção, a vida intrauterina, até o final do segundo ano de vida, compreendem uma primeira e imensa janela de oportunidade que pode determinar a chance de uma vida saudável ou os riscos de aumento de prevalência de doenças crônicas não transmissíveis (DCNT). A nutrição materna e infantil durante este período molda o futuro da criança.
A nutrição tem papel fundamental no crescimento e desenvolvimento durante toda a vida, principalmente nos períodos fetal e neonatal. Ainda existe uma integração e interferência direta da nutrição no período gestacional e no período neonatal. Por exemplo, a alimentação da mãe durante a gestação, irá contribuir na formação do paladar e até do olfato do bebê, devido ao sabor do líquido amniótico.
A ampliação do tempo de aleitamento materno e fortalecimento do vínculo mãe-filho, é outro fator importante para a prevenção da desnutrição e de outros distúrbios nutricionais. A OMS enfatiza como medidas importantes de saúde pública, com impacto efetivo na redução do risco da fome oculta, o aleitamento materno de forma exclusiva, até os 6 meses de idade. Estendendo-se até os 2 anos ou mais, aliado à introdução de uma alimentação complementar balanceada e equilibrada.
Os pais são responsáveis por providenciar alimentos adequados ou nutritivos e saborosos em ambiente agradável; deve-se permitir à criança escolher os alimentos, dentro dessa relação. E também podem estimular a atividade física, a mudança do estilo de vida, incrementando uma atividade habitual, como andar mais, usar escada em vez de elevador, atividades caseiras e de lazer, como dança, jardinagem e outras. Exercícios regulares de alta intensidade, como corrida, natação, bicicleta e esteira podem ser aliados.
Outra possibilidade implantar a redução do tempo de televisão e de jogos e aparelhos eletrônicos, reduzindo os hábitos sedentários da criança ou adolescente. E ainda realizar refeições com toda a família, em um mesmo lugar, sem distrações, como a TV e comendo lentamente, pois leva aproximadamente vinte minutos para o cérebro receber sinais de que o estômago está cheio. Comer rápido resulta em comer muito. Muitas vezes é necessário pedir à família e aos amigos ajuda para esse novo estilo de vida.
Reconhecer e parabenizar a criança por mudanças positivas relacionadas às mudança de hábitos também é essencial. Por último, os pais podem auxiliar as mudanças da criança, dando o exemplo, mudando o próprio comportamento alimentar e praticando atividade física.
UL: Qual a importância das brincadeiras ao ar livre, da prática de atividades físicas? Isso contribui para o desenvolvimento físico e emocional das crianças?
RM: Sim. Jogos e brincadeiras são muito importantes na vida da criança e do adolescente, para seu desenvolvimento físico, intelectual e social. O brincar ajuda a desenvolver a autoestima, a confiança e a reforçar a coordenação motora e as habilidades sociais. .
Seguindo as orientações do pediatra, é possível oferecer uma alimentação e hábitos mais saudáveis às crianças. Gostou da entrevista? Ainda tem alguma dúvida sobre o assunto? Compartilhe conosco nos comentários.